Gil Vicente E V. Guimarães: Uma Análise Da Fuga E Da Perseguição Na Obra

3 min read Post on Apr 12, 2025

Gil Vicente e V. Guimarães: Uma Análise da Fuga e da Perseguição na Obra

A obra de Gil Vicente, mestre do teatro português, e a de Vítor Guimarães, figura central do modernismo português, embora separadas por séculos, apresentam fascinantes paralelos na exploração dos temas da fuga e da perseguição. Este artigo mergulha numa análise comparativa, explorando como ambos os autores utilizam estes motivos recorrentes para revelar as complexidades da condição humana e criticar a sociedade da sua época.

A Fuga como Libertação e Como Prisão em Gil Vicente

Nas peças de Gil Vicente, a fuga frequentemente simboliza a tentativa de escapar de uma realidade opressora. Em peças como "Auto da Barca do Inferno" e "Auto da Barca do Purgatório", a fuga da morte, ou melhor, a tentativa falha de evitá-la, representa a busca pela salvação e a luta contra o pecado. A própria estrutura das peças, com personagens a embarcarem numa jornada rumo ao desconhecido (Inferno ou Purgatório), já em si representa uma metáfora da fuga – uma fuga física e espiritual.

A Fuga do Pecado: A fuga, em Gil Vicente, não é apenas geográfica, mas também moral. Personagens tentam escapar às consequências dos seus atos, mas a justiça divina, representada pelo Diabo ou pelo Anjo, inevitavelmente os alcança. Esta representação da impossibilidade de escapar às consequências das nossas ações é um dos temas centrais da sua obra.
A Fuga da Realidade: A sátira social presente nas farsas de Gil Vicente também utiliza a fuga como elemento narrativo. A fuga para o mundo da fantasia, da mentira ou da ilusão, reflete a incapacidade de confrontar a realidade social injusta e corrupta.

A Perseguição como Reflexo da Injustiça Social

A perseguição, em Gil Vicente, não é apenas um instrumento narrativo, mas um espelho da sociedade da época. A perseguição aos pecadores, aos pobres e aos desfavorecidos representa a injustiça social e a opressão religiosa. A figura do Diabo, sempre presente, simboliza a força opressora que persegue aqueles que desafiam a ordem estabelecida.

Vítor Guimarães: A Perseguição e a Fuga na Modernidade

Vítor Guimarães, em sua obra, reinterpreta os temas da fuga e da perseguição numa chave moderna. A sua narrativa frequentemente retrata indivíduos à margem da sociedade, perseguidos por forças externas ou internas. A fuga, neste contexto, pode representar a busca pela identidade, pela liberdade ou pela sobrevivência num mundo hostil.

A Fuga como Busca da Identidade: Em muitas das suas narrativas, os personagens fogem de um passado traumático ou de uma identidade imposta, buscando uma nova vida, uma nova identidade.
A Perseguição Interna: Guimarães também explora a perseguição interna, a luta contra os próprios demónios, a angústia existencial. A fuga, neste caso, é uma tentativa de escapar de si mesmo, de confrontar as próprias sombras.

Paralelos e Diferenças: Uma Conclusão

Tanto Gil Vicente como Vítor Guimarães utilizam a fuga e a perseguição como temas centrais, mas com nuances diferentes. Gil Vicente utiliza-os para criticar a sociedade medieval e a sua moralidade, enquanto Guimarães os reinterpreta para refletir sobre a condição humana na modernidade. No entanto, ambos exploram a complexidade da condição humana e a luta constante entre a liberdade e a opressão, a fuga e a perseguição. A análise comparativa da sua obra revela a perdurabilidade destes temas e a sua capacidade de transcender as épocas e os contextos históricos. A busca pela liberdade, a fuga da opressão, a perseguição da justiça – estes são temas atemporais que continuam a ressoar na literatura portuguesa e na experiência humana.